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montesclaros.com - Ano 25 - terça-feira, 19 de novembro de 2024
 

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Mensagem: Natal da minha infância

Ruth Tupinambá Graça

Pronunciado por Ruth Tupinambá Graça por ocasião da novena do Natal realizada no Edifício Vila Rica, na avenida Mestra Fininha, 536.

Queridas companheiras,
Hoje termina a novena, há momentos em nossas vidas que não encontramos palavras para traduzirem o que sentimos e o que vai em nossos corações. Acreditem, gostei demais dessa nossa convivência e não poderia deixar de manifestar-me.
Quero, neste momento, agradecer a Nossa Senhora, Nossa Mãe Santíssima, esta oportunidade de acompanhar, com vocês, esta novena de Natal, esta demonstração de amor e piedade como verdadeira cristã.
Ouvindo estes cantos tão bonitos e emocionantes, as preces e depoimentos tão cheios de fé, durante este nosso encontro, eu me transportei ao passado, especialmente à minha infância e a saudade bateu forte neste velho coração, tudo veio a minha imaginação, como um filme lindo, colorido, que vimos na infância e do qual jamais esqueceremos.
Como num “passe de mágica”, lembrei-me da antiga Praça da Matriz, (hoje Dr. Chaves) onde passei toda minha infância, acompanhando todas as festas religiosas, nesta Matriz de nossas Senhora e São José, principalmente, as comemorações do Natal. Eu ficava encantada, com o presépio daquela igreja!
Era com verdadeiro amor e devoção que eu ia visitá-lo e na minha inocência eu sofria vendo o Menino Jesus com seu corpinho seminu, deitado sobre palhas, numa manjedoura, somente aquecido pelos animais que o cercava, enquanto Nossa Senhora e São José contemplavam extasiados aquele milagre!
A mamãe (quanta saudade) dava-me todos os dias, uma moedinha que eu levava (apertada na pequenina mão) para colocá-la aos pés do Menino Jesus, Isto eu fazia com aquela alegria, fé, inocência e sinceridade que só as crianças sabem fazê-lo. Como me recordo de tudo! O Natal daquele tempo era tão diferente.
As crianças tinham mais fé e adorava o menino Jesus e o Natal era um acontecimento importante em todos os lares. Acreditavam no Papai Noel e esperavam o “bom velhinho” com ansiedade; e pela manhã quando acordavam os olhos brilhavam de alegria vendo, nos seus sapatinhos, os esperados presentes.
Mas era tudo tão simples! Sem o exagero de hoje, mas cheio de amor e devoção. Naquele tempo, nossa cidade era pequena e longe da civilização, mal servida de comunicação, esquecida pelos nossos governantes, mas extremamente tranqüila e solidária. As famílias se comunicavam encontrando tempo para visitar os amigos, vivendo como uma só família, livre das cercas elétricas e dos muros altos, que hoje, infelizmente, dificultam as visitas.
Eu me recordo de tudo (a cabeça ainda está boa), em todas as casas o presépio era o grande acontecimento do Natal e cada qual se esforçava para fazê-lo mais bonito.
Lembro-me da minha mãe, tingindo os jornais de preto (com pó de carvão) para fazer a gruta, plantando também o arroz em latinhas (no dia de Santa Luzia) para enfeitar o presépio de nossa casa; colocando espelho fingindo água, onde os patinhos nadavam...
Eu ajudava a minha mãe, arranjando sempre uma novidade (uma pedrinha diferente, uma casca de pau coberta de lodo, um cogumelo) para ornamentá-lo.
As famílias preparavam-se para receber as visitas e juntas rezavam o terço e cantavam emocionadas as melodias do nascimento de Jesus.
O grande Largo da Matriz era o ponto alto onde tudo acontecia.
Vinham também as pastorinhas, lindas com roupas e arcos coloridos. Ao som dos pandeiros dançavam e cantavam alegrando ao ambiente.
Eu me recordo, também, da Folia dos Santos Reis, que vinha de longe trazida por meu tio Pedro Mendonça, que a organizava e era o mais entusiasmado “folião”. Em noite alta, quando a lua prateava aquela praça, acordávamos com os seus cantos, visitando as famílias, pediam licença e entravam.
A felicidade daquele grupo de homens do campo, na simplicidade de seus trajes, com alvas toalhas bordadas em volta do pescoço, cujas pontas caíam na frente onde se descansavam as violas, rebecas e violões, era cativante. Prestavam homenagem aos Reis Magos com seus cantos numa extraordinária devoção e fé inata de corações tão puros.
Entristece-me hoje sentir a diferença do Natal de outrora. O consumismo tomou conta de tudo e de quase todos, e as compras exageradas se multiplicam.
De modo geral, enaltecem demais o Papai Noel e os presépios estão cada vez mais escassos. O menino Jesus deixou de ser o símbolo do Natal. Mas, felizmente, ainda existem famílias como vocês que comemoram com muito amor o 25 de dezembro enaltecendo Nossa Senhora e se amado filho.
Agradeço de coração a oportunidade de participar com vocês desta novena, que termina hoje, e me fez voltar ao passado e recordar a minha infância.
Rezamos juntas, e juntas nos conhecemos melhor, nesta convivência de religiosidade que, por certo, recordaremos com muita saudade na certeza de que: Haverá sempre um Natal enquanto existir amor verdadeiro em nossos corações.
Um feliz Natal para vocês e familiares, e que o Jesus esteja sempre presente em nossas vidas e nos proporcione outros encontros, outras novenas, outros Natais.

(N. da Redação: Ruth Tupinambá Graça, de 94 anos, é atualmente a mais importante memorialista de M. Claros. Nasceu aqui, viveu aqui, e conta as histórias da cidade com uma leveza que a distingue de todos, ao mesmo tempo em que é reconhecida pelo rigor e pela qualidade da sua memória. Mantém-se extraordinariamente ativa, viajando por toda parte, cuidando de filhos, netos e bisnetos, sem descuidar dos escritos que invariavelmente contemplam a sua cidade de criança, um burgo de não mais que 3 mil habitantes, no início do século passado. É merecidamente reverenciada por muitos como a Cora Coralina de Montes Claros, pelo alto, limpo e espontâneo lirismo de suas narrativas).

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