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Mensagem: A BALADA DE TONY BOO-GOO-LOO Extrovertido foi Tony Boo-goo-loo. Conhecia praticamente todo mundo e, se não o conhecessem, dava-se a conhecer. Alegre, desprendido, brincalhão, peça rara. Oriundo de Boc-Citi, surgiu em Moc num daqueles verões dos anos dourados. Hospedou-se no melhor hotel. Gastava a rodo. Nas horas-dançantes dos clubes e residências brilhava mais do que todos ao exibir-se na dança da moda, o boo-goo-loo, substituta do twist e congêneres. Daí seu apelido. O conjunto de pernas e braços em ação dava ao dançarino a aparência de um desses bonecos mané-molengos. Tony era o melhor naquilo e logo despertou invejas. Além do mais, tratava-se de um forasteiro botando banca em Moc-Citi. ´I-na-cei-tá-vel!´ - bradavam alguns dos guardiões locais. Alto, moreno - um moreno hindu -, olhos verdes, tinha Tony os cabelos pretos levemente ondulados. Uma basta e bela cabeleira. As garotas caíam-lhe em cima. Mais invejas, mais ciúmes... Alguns xenófobos já planejavam dar-lhe um cacete, correr com ele da cidade. E se tal não aconteceu deveu-se à sua amizade com os músicos de uma das nossas bandas de rock, Os Eremitas, cover dos Stones e muito queridos. Desta banda tornou-se Tony o empresário. Lucros não lhe importavam. Bancava tudo: instrumentos, bebidas, comidas, farras... Vestia-se como um príncipe, um príncipe psicodélico: calças de cetim - por vezes roxas! -, botinas ou botas de verniz, camisas de seda floridas, colares... Brincos, piercings e tatuagens viriam alguns anos depois. Um velhote careta, ao vê-lo assim trajado, quase sofre um infarto: “Esse menino é transviado! Arreda, Satanás!” Com três dias de namoro, Tony presenteou a eleita com uma aliança de brilhantes. Que lhe foi devolvida pela moça, em prantos, forçada pelo pai, que esbravejara: “Onde já se viu?” Tony não se conformava: “Que coroa desnaturado! Minhas intenções são as melhores possíveis! Estou apaixonado pela Fernanda!” O idílio não venceu aquele verão, mandada que foi a pobre garota para um internato em Pará de Minas. Anos dourados?... A bomba retardada explodiu quando a conta da joalheria Coelho bateu em Bocaiuva. Seu Antônio sequer almoçou naquele dia. Ao volante de sua Rural-Willys, chegou a Moc por volta de uma da tarde. Sol a pino. O filho ainda dormia... Antes de mais nada fechou a conta do hotel. Horrorizou-se: dúzias de cervejas, vodkas, garrafas de Drury’s, pacotes de cigarros (Tony não fumava...) e notas de restaurantes pagas pela gerência... Preencheu o cheque e determinou que acordassem o moleque. Dentro de meia hora viria buscá-lo – avisou – e que estivesse pronto, mala na mão! Acabara-se a esbórnia! Dali foi à joalheria e quitou a aliança. Tony o esperava na recepção do hotel, cabisbaixo, cara de santo, arrependido... - Bonito, hein? Muito bonito! Anda, direto pra casa, vagabundo! – berrou o pai. E dirigindo-se ao gerente do hotel: - Se aceitá-lo novamente aqui, o problema é seu! Tony estivera a conjecturar o acontecido. Só podia ser a tal aliança... Na joalheria, dera o nome do pai, endereço, telefone... Há dez dias vinha enrolando o cobrador... Ao entrar no carro disse ao pai: - Sei que errei, velho... - Cala a boca! Calou-se. - Pensa que sou Onassis? - Eu ia devolver a aliança... - Devolver? - Sim, o pai da moça mandou-a recusar o presente... Aqui está. - Está ficando louco, meu filho? - Foi o amor, pai... - Ah, sim, o amor... Pois fique sabendo que vai curar essa doença no cabo da enxada! - Mas, pai... - Calado! A despesa do hotel foi momentaneamente relevada por Seu Antônio. Quanto a aliança, seria presenteada à filha mais nova por ocasião de seus 15 anos. Dias sombrios emolduravam o horizonte de Tony Boo-goo-loo. Seu sonho de estudar em BH acabara de ir por água abaixo, pelo menos naquele ano... Se quisesse, disse-lhe o pai, podia deixar Boc-Citi, contanto que fosse para um colégio interno: Dom Bosco ou Caraça... Mas, mãe é mãe, e a dele conseguiu do marido o abrandamento da pena. O moleque iria trabalhar com ele, sim, mas não no cabo da enxada. Decorridos alguns meses, Seu Antônio confiou ao filho o pagamento do pessoal da fazenda. Não era coisa de pouca monta. Havia trabalhadores fixos, dois tratoristas e a turma do milho... Lá se foi o nosso herói com uma caixa de sapatos repleta de dinheiro. No bolso, a lista de empregados. Aguardavam-no estes sentados na mureta da varanda que circundava a sede da fazenda. Ao vê-lo seus rostos se iluminaram. E Tony experimentou grande satisfação ao pagar-lhes. Abriu o escritório, tomou assento à mesa como muitas vezes vira o pai fazer, mandou servir um cafezinho a todos e deu início ao procedimento. - Seu Malaquias! – chamou o primeiro. Veio Malaquias com o chapéu na mão. Um fiapo de homem. Embora tivesse 40, mostrava 60 anos... - O senhor só ganha isso, Seu Malaquias? – perguntou Tony estupefato consultando a lista. - Inhô sim... - Pois a partir de hoje o senhor terá um aumento. - Brigado, patrãozim... - Seu Jurandir! Prosseguiu com a chamada e os aumentos salariais. Ao final o dinheiro não foi suficiente para pagar a todos... Tony prometeu voltar no dia seguinte e saldar a dívida para com os outros. Nunca mais voltou. Dizem que o pai o expulsou de casa a tiros... Verdade ou não, o fato é que Tony escafedeu-se para a casa de um tio. A mãe mandou-lhe a mala e algum dinheiro e o tio deu-lhe a passagem de trem para Belo Horizonte. Lá, a madrinha e tia financiou-lhe a ida para São Paulo, onde pretendia trabalhar. A essa altura já fizera seus planos... Na capital paulista hospedou-se com uma senhora de Boc-Citi que ali mantinha uma pensão – dona Amélia Barbosa. No dia imediato à sua chegada, pasmem!, bateu na casa de ninguém menos do que o rei do Brasil. Sim, bateu na porta de Chatô*, o magnata da mídia nacional, fundador da TV no país (TV Tupi), proprietário de dezenas de jornais e centenas de emissoras de rádio. Tocou a campanhia, veio o mordomo. - Eu gostaria de falar com o dr. Assis Chateaubriand. - Quem é o senhor? - Sou de Bocaiuva, Minas Gerais. Meu nome é Antônio Alkmim. Diga ao dr. Chateaubriand que sou sobrinho do Zé Maria. - Conheço o seu tio... Não esperou dois minutos. Foi prontamente atendido por Chateau. - Sente-se, meu jovem, que bons ventos o trazem? Que prazer! Como vai nosso ministro? - Dr. Chateaubriand, tenho uma coisa a lhe dizer... Sou de Bocaiuva, mas, infelizmente, não sou sobrinho do dr. José Maria Alkmim, a quem conheço desde menino. Ele é amigo da minha família. Desculpe-me, mas essa foi a única forma que encontrei para falar com o senhor. Tamanha ousadia conquistou o rei, que pela própria trajetória de vida várias vezes fizera o mesmo ou pior. Tony ficou para o jantar e no dia seguinte assumiu um cargo nos Diários Associados. Alguns anos depois encontramo-nos em BH, Cantina do Lucas, onde almoçamos. Ele estava impecável, metido num terno caríssimo. De São Paulo fora para o Rio, onde trabalhava numa multinacional ligada à extração de minérios. Deu-me o seu cartão de visitas. Combinamos sair à noite, que começou na Casa dos Contos, prosseguiu na boate Sagitarius e acabou no Hotel Del Rey... Nos seus anos de Rio, Tony relacionara-se com uma garota de Boc-Citi que lhe deu uma filha. Ambas, mãe e filha, aí residiam quando a menina debutou. Do Rio, Tony encomendou a melhor festa de 15 anos já vista na região: buffet, orquestra, show... Só vi o convite quando retornei de Salvador... E, de volta ao Rio, seu conversível Porsche – o que nos remete a James Dean – encontrou uma carreta na BR-3... · Vide Chateau, o rei do Brasil. Ed. Cia das Letras. Autor: Fernando Moraes · Assis Chateaubriand esteve em Montes Claros por ocasião da sua doação de uma aeronave, a primeira, ao Aero Clube local. Hospedou-se no sobrado dos Oliveira, praça da Matriz.
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