Iara Tribuzzi
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Por Iara Tribuzzi - 30/7/2018 10:34:28 |
Festa no Céu II Iara Tribuzi Estamos à procura de José - o santo - pai do Menino Jesus - e do seu xará José Versiani dos Anjos. O primeiro, justo e destemido, desposou Maria, apesar da inexplicada gravidez, livrando-a da condenação pelos homens do Sinédrio, se alguém a denunciasse. Ela se refugiou nas montanhas, junto à prima Isabel e ao primo Zacarias, integrante do Sinédrio, que ficara mudo enquanto aguardava a chegada do primeiro filho - João Batista. O segundo José é o avô materno, filho do Coronel Antônio dos Anjos, que não cheguei a conhecer. Morreu quando a minha mãe tinha dez anos, e ela sempre me falava dele: - Este seu cabelo é igual ao do meu pai... São José deverá explicar a São Pedro como tenho sido cobrada para continuar o cortejo da Festa no Céu, trazendo a fila das mulheres. Ele as está segurando sem motivo algum, de pura implicância! Dizem que sua rabugice teve início quando acompanhava o Mestre pelas estradas poeirentas da Judéia. Certo dia encontraram sua sogra acamada, gravemente enferma, e Jesus a curou, milagrosamente. O guardião do céu não se atreveu a comentar mas guardou para si que Jesus poderia ter ficado quieto. E permaneceu rabugento. José, ponderado e conciliador, explicará que os Versiani são gente ordeira, não haverá tumultos. O chefe do cerimonial aclamado por unanimidade é nosso tio Tatá- Artur de Oliveira Versiani, pachorrento e tranquilo, filho do Dr. Carlos Versiani, irmão da avó Carlota e da tia Elisa. Morou sempre em sua pequenina fazenda no município de Contendas. Não se desgastava com o movimento da capital, e tinha paciência de Jó. Ninguém conseguia apressá-lo. Terá especial cuidado com o Dr. Velloso, seu cunhado, a quem impacientavam as excessivas atribulações do cargo de desembargador do Tribunal da Relação. Costumava acordar de vez em quando muito contrariado e anunciava à mulher que iria ao Cemitério do Bonfim sapatear na tumba de um desafeto... - Deixe o homem sossegado! Recomendava a tia Elisa, sem espanto ou alarde. Então o avô Veloso ia quebrar o jejum com café e roscas glaçadas na sala de jantar da sua residência, até hoje bonita situada na capital mineira à rua Bernardo Guimarães, 1200. Pertinho da igreja de Lourdes. Iara Tribuzzi/No grande eclipse da lua Inverno de 2018 |
Por Iara Tribuzzi - 1/7/2018 9:22:33 |
Salinas & Macondo A Salinas antiga tem se revelado como a Macondo do Garcia Marques - há fatos que existem e não existem, e o sobrenatural convive com o dia a dia. Acreditamos nas visages com que se deparava muita gente. Difícil era acreditar nas instruções do catecismo e das freiras - céu, inferno e purgatório. Sylo Costa, recentemente encantado, afirmava que Saco Toicin, um homem alto e forte, trabalhador aplicado quando não estava troviscado pela pinga, vivia à procura da beirada do mundo. Frequentava os velórios, e se servia com fartura dos aperitivos para beber o morto, além das caprichadas comidas ofertadas para resistir ao sono e às vezes ao frio. A noite era longa. Quando morreu uma autoridade que de vez em quando o mandava prender para curar a carraspana, ele fez questão de verificar o fato. Chegou à sala de visitas onde todos respeitosamente velavam o defunto. Ao vê-lo despojado do comando, cantou, com voz potente Alevanta, côro véi Lucifer vem te buscar Os anjin de oi de fogo Tá prontin pra te levar. Teve de sair correndo. Os praças, seus conhecidos, já vinham prendê-lo. Correu e correu, e logo a fome apertou. Não tinha se servido durante o velório, não houve tempo. Tomou uma estradinha escura, no meio do mato, logo o perderam de vista. Depois de algum tempo, além da fome que apertava, tinha a nítida impressão de que uma visage o acompanhava. Os perseguidores tinham ficado para trás. O caminho cortava um boqueirão, o arvoredo aumentava a escuridão, e o medo aumentava também. Devoto de Nossa Senhora, Saco Toincim, apelou a ela para resolver a dificuldade. Jogou um verso, improvisado na hora: Vem me ajudar A Senhora também A oiá pra trás Ver quem é que evém... |
Por Iara Tribuzzi - 29/6/2018 09:07:26 |
Festa no Céu Hoje a Igreja Católica celebra o dia de São Pedro, guardião das chaves da porta do céu, e ele estará cumprindo fielmente sua tarefa ao receber Marco Antônio Veloso dos Anjos, que se encantou no último sábado. O Santo Convocou o avô Antoninho - Cel. Antônio dos Anjos, sua mulher dona Carlota Versiani, com o pai Carlos Versiani, grande médico e benfeitor dos montesclarenses, ao lado de dona Elisa Cata Preta Versiani, para abrir o cortejo. Logo atrás vêm os pais de Marco Antônio: Benjamim dos Anjos, alegre, pq gosta das festas juninas, sempre as celebrou na fazenda, e dona Palmira, abatida, mas risonha. Junto deles está Gilberto Versiani dos Anjos, seu primogênito querido, muito moço, e Pedro Augusto, xará do onomástico, encantado ao receber o irmão do meio. Uma legião de primos vem se agregando, o mesmo grupo que se reunia alegremente para ir às festas do tio Bejo, no mês de julho, na fazenda. Carlos Augusto Costa - Cacá - bonito como sempre, vem com os irmãos Mario e Binha, perto de Ricardo e Haroldo Veloso- recém chegado. João Porfírio Sarmento e Wilson Ramos - bisnetos do avô Antoninho, que acabara de criar suas mães órfãs, estavam com Danielzinho Drummond, Paulo Gontijo Cardoso e Frederico Penido Veloso, o ultimo chegado há pouco. São os caçulas da turma. Martim Afonso, Antônio Joaquim e Chico, afilhado do poeta Drummond, estão com Geraldo Silveira dos Anjos, tão cruelmente assassinado. Surgem os irmãos Tito, José, Artur, Tonico, Pedro, Valdemar, Cyro e Carlito, trazendo com eles Mário Versiani Veloso - amigo/primo/irmão. Mas... e as mulheres? As tias Alice, zelando pela família que generosamente assumiu, Nieta - pintora e pianista - Maria Elisa contando histórias, Quinha em sua cadeira de rodas, Biela que tantas vezes tocava o harmônio da Matriz de Nossa Senhora e São José, Nonó, tão querida, Maria Cândida, Zenólia, Lilita, Joana D Arc – a nossa Joaninha – e Sofia. Estão meio escondidas, chegarão muito devagar, timidamente, porque, segundo as más línguas, São Pedro tem uma rusga ancestral com as mulheres, causada pelo brilho de Maria Madalena. Os descrentes até afirmam que seria misógino... |
Por Iara Tribuzzi - 29/11/2017 09:59:16 |
Fiquei muito alegre e sensibilizada com o comentário (abaixo). Agradeço ao remetente, cujo nome não consegui visualizar. Talvez possa se identificar para que lhe envie outras histórias da Montes Claros antiga, que é dos meus amores também..São todas elas boas e doces,e também já sou avó... Muito gata pelas lembranças dos tios e primos. O senhor leu "A caixa de Bisa"? *** A Sra.Iara Tribuzi, em sua crônica de ontem, citou nomes que me tocaram o coração. Fui estudante do Colégio Diocesano nos melhores tempos da minha juventude e por que não dizer e de Montes Claros também? Montes Claros era o nosso sonho: Colégio bom com colegas excepcionais, Praça de Esportes com a sua piscina formadora de campeões, quadras de vôlei e basquete, sempre muito e por todos disputadas, o desfile das garotas mais bonitas de Minas Gerais. Não citarei nomes, muitas já senhoras e avós, quando não já falecidas. Mas como eram bonitas nas suas juventudes respectivas. O Mário Velosos, nosso colega de turma, infelizmente já falecido, ficava vermelho quando o Reynaldo Artur(filho do Dr. Dárcio) e eu elogiávamos a sua irmã, linda e loura a Bisa.Era normal, nos finais de semana, bailecos na residência de cada um. Afastavam-se os móveis, um toca-disco que chamávamos de ´pick-up), discos de 78 rotações, mas sempre com músicas recém lançadas. As meninas mais lindas da cidade eram avisadas e compareciam. Afinal,éramos os meninos, metidos a rapazes mais conhecidos delas e atletas,muitos com medalhas de campeões de natação ou futebol . Os bailes mais frequentes eram na casa do Gilberto Veloso, do Marco Antonio e do Pedrinho, filhos da d.Palmira e ´seu´Benjamin dos Anjos.Pais e filhos de uma camaradagem ímpar. Amigos inesquecíveis, enquanto vivermos ainda. Esta família não era deste mundo, tanto é que Deus os levou, a todos. Ficou uma saudade imensa. Meu Deus, como Montes Claros era uma cidade amistosa. A nossa juventude foi de dar pena nos jovens atuais. Éramos realmente felizes, bons alunos no Colégio, atletas campeões no campeonato mineiro de natação, e o Joválcio Maurício batendo o recorde brasileiro dos 100m rasos da época. Como tínhamos grande nadadores. Não os citarei. Poderia cometer injustiça omitindo nomes. Quanta coisa importante ocorreu nesta cidade na minha época. Houvbe até eclipse em que o melhor lugar do continente para ser observado era aqui. A cidade nunca recebeu tantos astrônomos como naquela época, creio que no ano de 46. Já faz tempo. Ficaria uma dia inteiro recordando as boas e doces coisas. As amargas não. Ah Montwes Claros dos meus amores... |
Por Iara Tribuzzi - 16/11/2016 10:20:15 |
O rio levou meu riso Não é fácil estar sozinha. Já tive dez pessoas à mesa, agora tenho minhas fugas. De madrugadinha vou acordando devagar, me espreguiçando e, meio tonta de sono, rezo uma parte do ofício de Nossa Senhora, que é muito poderoso. Disso tenho certeza, porque minhas tias paternas sempre o rezavam todinho quando eu era pequena, na casa de vó Milota, e eu, escutava. Adulta, acompanhei-as na doença e assisti às suas mortes. Foram mortes bonitas, em paz, sem tubos nem outros aparatos de CTI. Uma delas, Madrinha Zu, o rezava calmamente em seu Jeito de morte, tranqüila, como se fosse dormir. Hoje, aos sessenta anos peço a Nossa Senhora que me dê uma boa velhice, uma boa caduquice e uma boa morte. Meus filhos caçoam: - Mãe, onde já se viu caduquice boa? E eu lhes respondo: - Tenho tanto medo de caduquice ruim porque um tio paterno ficou muito alterado e estranho, cismando que seus filhos o estavam roubando. Um dia ligou para a filha dizendo que ela tinha levado da casa dele os pratos de um aparelho de jantar. De um dos filhos ele levou para a fazenda a caixa de ferramentas, dizendo que lhe pertencia. De outro, tirou um ventilador e trancou no seu escritório, afirmando que o havia comprado. Sei de muitas caduquices. Uma delas é de uma amiga de Santa Luzia que ficou muito econômica depois do apagão, deixando em casa apenas uma lâmpada presa ao teto por um fio bem comprido e carregando-a por toda parte, até para o quintal, tentando economizar energia. Quando perguntamos como vai passando responde: - Oh, moça, de dia com um ovo quente e de noite com um bule de chá. Minha família tem vários octogenários e a antiga babá lá de casa observava: - Seu povo véve muito! Tenho medo de viver demais e também tenho medo de morrer. Medo de morrer eu não deveria ter, sou muito religiosa, mas como não tenho certeza da existência do céu fico com pena de ir assim, deixando tanta coisa boa. Minhas lembranças antigas são cada vez mais nítidas. As vozes da Praça do Mercado de Salinas, onde me criei, as cantigas entoadas por um vizinho, os acordes da banda, o tropel dos cavalos, o passo cansado dos burros de carga, o eco dos passos trôpegos dos homens troviscados, as instruções das professoras do Grupo Escolar e o chamado de mamãe - "Iara, saia do curral!" permanecem vivas. Até hoje sei todas as rezas que aprendi no internato, as partes da missa: Kyrie, Glória, Confiteor, Sanctus, Benedictus, Pater Noster, Agnus Dei, tudo entoado em latim. Todas as noites, na benção do Santíssimo Sacramento, cantávamos Tantum Ergo, a ladainha de Nossa Senhora, a Salve Rainha e, na Semana Santa, as antífonas. Fico tocada quando me lembro dos rituais litúrgicos, das procissões. Para exorcizar meus fantasmas ouço música, estudo filosofia, leio alguns romances e pouca coisa nos jornais, o jornal todo eu não leio não, porque só tem más notícias. Na TV revejo filmes bem antigos, a que assisti quando mocinha: Morangos silvestres, O rio das almas perdidas, Paisá, A hora do lobo, Amar foi minha ruína, Sete noivas para sete irmãos, O sol por testemunha, Casablanca ... a filmes novos assisto no cinema, acho ótimo não pagar. Os sexagenários tem entrada franca e com o dinheiro da entrada pago o estacionamento ou dou um trocado ao menino que "toma conta" do carro. Contudo gosto mesmo de ir a concertos. A música me arrebata por inteiro e nela fico imersa. Tenho tentado fazer contatos com antigos colegas, aqueles do curso primário no Grupo Escolar Dr. João Porfírio, que não vejo há décadas. Outro dia me ligou uma delas e não consegui me lembrar das suas feições. Mas ela se lembrava de mim e perguntou: - Ó Iara, você ainda tem o cabelo avermelhado e escorrido? - Ah, quem me dera! Agora tenho uns poucos fios brancos, não uso tintura. As amigas dizem que é muita sorte, pois elas estão com a cabeça branquinha. Disse meu neto: - Oh Vó, não é toda gente gorda que senta no chão, não. Só você. Sou muito rezadeira. Aqui no oitavo andar cultivo para Nossa Senhora rosas daquelas antigas, que florescem em pencas bem perfumadas e muitos as chamam de rosas de Santa Terezinha. Outras as usam para banhos de descarrego. Desde a madrugada sinto o perfume delas porque as deixo num vaso junto à imagem de Nossa Senhora, que é linda e que eu trouxe com muito cuidado, do Santuário de Fátima até aqui. Este apartamento, comprei depois de fazer uma novena para Nossa Senhora do Carmo e pedia muito a ela que me fizesse companhia depois que meus filhos se casassem. Depois da cerimônia do casamento do último filho que morava comigo, chegando em casa tive um impacto terrível ao abrir a porta. Faltava algo nas minhas entranhas e me lembrei da canção do Chico Buarque “ó metade tirada de mim!”. Ó metade amputada de mim! Entendi o que os psicólogos e analistas americanos querem dizer da síndrome do ninho vazio. Costumo caminhar todos os dias na Praça JK, lá encontro companhia. Às terças-feiras não faço caminhada, é dia de rezar o terço na Igreja de Santo Antônio pelas famílias. Aproveito para pedir a ele - milagroso e casamenteiro - que me arranje um namorado. Não precisa ser moço, nem bonito, mas que tenha boa prosa, saiba rir, e possa ir comigo ao supermercado com bom humor ... Tenho saudades dos risos e escrevo para Salinas: Oh Salinas O rio levou meu riso Machado cortou meu sonho Triste fogo das queimadas Apagou minhas certezas A desolação Traz nas cinzas Doces lembranças Ressuscita meus afetos Mais duras Que as pedras Da Praça e das tuas ruas São minhas saudades. Belo Horizonte, verão de 2000 Iara Tribuzzi |
Por Iara Tribuzzi - 2/11/2016 09:05:22 |
A Caixa de Bisa Tenho tentado, há dias, organizar o meu acervo fotográfico - uma grande caixa de papelão forrada de tecido adamascado. Aprendi a guardar assim as fotos com a prima Bisa – Maria Luiza Veloso Costa – amiga desde os dias de Montes Claros e vizinha aqui em BH, por muitos anos. Uma tarde pediu que fosse à sua casa. Já vinha adoentada e muito abatida pela perda dos irmãos Eduardo e Mário, falecidos no intervalo de uma única semana. Avisou que tomaríamos um café, sem pressa. Sua doença não a abatera fisicamente, me parecia ainda ter forças para resistir por algum tempo. Trouxe uma grande caixa florida, repleta de fotos que emanavam cheiro de antiguidades, e me pediu que tomasse conta delas. Pertenceram à sua Vó Nietta, irmã do meu avô José Versiani dos Anjos, e tinham sido guardadas pela sua mãe Elisa. Não queria que saíssem da família e sua hora estava próxima. Jamais vi alguém mencionar a própria morte com tanta calma, sem amargura. Disse que deixaria comigo aquelas fotos antigas e explicou que deveria entregar algumas às netas de tia Joaninha, outras aos primos Bruno e Flavio, filhos do tio Waldemar Versiani, e a Maria Beatriz Velloso de Menezes, casada com Ivo Porto de Menezes, filha do Dr. Carlos Augusto Versiani Velloso e de D. Nemita, e irmã mais nova de Maria de Lourdes*. Fiquei muda, quieta, e mergulhamos nas lembranças do passado, nosso tema predileto. Falou da morte do pai, o engenheiro montesclarense Joaquim Costa, que muito gostava de viver. Segundo mamãe, era em suas viagens para o Rio de Janeiro que ele aprendia as marchinhas de Carnaval. E, quando voltava, as ensinava aos amigos e às primas de Montes Claros em alegres reuniões. Cantavam entre outras: “Lourinha, lourinha Dos olhos claros de cristal Desta vez em vez da moreninha Serás a rainha do meu carnaval (bis) Loura boneca que vens de outra terra Que vem de Inglaterra Que vem de Paris...” Ou ainda: “Linda morena, morena Morena que me faz penar A lua cheia que tanto brilha Não brilha tanto quanto o teu olhar” Nos seus últimos dias, Joaquim Costa, sempre tão alegre, se entristeceu, ficou contrariado e se virou para a parede. Não querendo mais conversa, se entregou definitivamente. Tempos depois, sua mulher Elisa acordou à noite, queixando-se a Bisa de indisposição. Talvez o jantar estivesse lhe pesando. Bisa foi à cozinha, pôs um pouco de bicarbonato num copo d’água e, voltando ao quarto, encontrou a mãe agonizante. Recordamos também a magia da festa do centenário de Montes Claros, em julho de 1957. Bisa brilhou como sua rainha. O parque de exposições João Alencar Atayde havia sido inaugurado e à noite houve bailes memoráveis no Clube Montes Claros. Dançávamos até de madrugada, quase manhã, ao som dos conjuntos musicais trazidos do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte. Todas nós tínhamos um primo como par constante. E o de Bisa era Martim Afonso, filho de Tio Cyro e Tia Lilita. O meu, Antônio Joaquim, irmão do primeiro. Passada a festa todas nós nos conformamos com a perda do par. Bisa ficou desolada, não havendo jeito de esquecer o namorado. Ajuizadamente, toda a família alertou para a existência de muitos casamentos consangüíneos entre nós. Então Bisa fez uma promessa: iria diariamente à missa da Matriz e comungaria até conseguir esquecer o primo. Rezou e rezou e a lembrança foi se apagando naturalmente. A dor da perda se amenizou. Um dia, fomos convidadas à sua casa e lá estava o jornalista Lincoln Prates Santos – um feioso adorável. O namoro foi muito estimulado e, logo depois do seu retorno a Belo Horizonte, deram início a uma longa correspondência. Naquele tempo não havia e-mails e não se usava, sem cerimônia, o telefone da família. Bisa punha no bloco de papel de linho suas ideias e, em seguida, a mãe Elisa corrigia sua escrita para evitar erros crassos, porque as cartas de Lincoln eram lindas, impecáveis! O casamento aconteceu no princípio de janeiro de 1961. Temos a foto, primas e amigas ao redor dela. Pena que não inclua seu irmão Cacá – Carlos Antônio Velloso Costa, muito belo, parecidíssimo com Marlon Brando. Por me faltar coragem, deixei passar alguns anos antes de cumprir o pedido. Ao fazê-lo agora, fui tocada por sua inesquecível presença de vitalidade e alegria. Descobri que meu coração, relicário de tantas lembranças de família, se transformou na caixa de Bisa. Iara Tribuzzi Outono de 2016 Família do Desembargador Antônio Augusto Veloso * Maria de Lourdes aparece no colo da mãe Dona Nemita Arthur Versiani Veloso é o último à direita, de pé |
Por Iara Tribuzzi - 23/12/2015 08:39:45 |
Mensagem: Ofícios de outrora A lembrança dos Reis Magos salinenses me levou de volta à antiga rua da Avenida, onde o Lô Latoeiro tinha sua pequena oficina, entre a casa das irmãs Galvão e a família Cardoso - parentes do Procópio Cardoso Neto. (...) Oi,Wanderlino, Muito lhe agradeço pelo generoso comentário do meu texto, que está às suas ordens. Também já viajei sentada no cabeçote da sela,e vou ler com muito gosto "Dos oitenta anos".Me avise,por favor , a data do lançamento. Um afetuoso abraço de Boas Festas, e que 2016 lhe traga muitas alegrias, além do novo livro. |
Por Iara Tribuzzi - 22/12/2015 10:36:25 |
Ofícios de outrora A lembrança dos Reis Magos salinenses me levou de volta à antiga rua da Avenida, onde o Lô Latoeiro tinha sua pequena oficina, entre a casa das irmãs Galvão e a família Cardoso – parentes do Procópio Cardoso Neto. Lô tinha o lábio leporino, mas falava sem dificuldade, todos o conheciam e compravam sua arte. Ecologia e reaproveitamento eram temas desconhecidos, e ele já aproveitava o material de todas as latas de 20 litros de querosene Jacaré, de manteiga Oriente vindas da vizinha Pedra Azul e de outras para fazer grandes ralos usados na farinhada da mandioca, de que também se tirava a goma ou polvilho. Nas primeiras adaptava uma trave de madeira, e eram então usadas para buscar água no rio Salinas ou no chafariz da Rua da Lagoa. Das outras, fazia copos de todos os tamanhos, fifós enfeitados e lindas flores de metal. Mamãe me contava, muito admirada, que quando começou a trabalhar no grupo escolar Dr. João Porfirio, costumava percorrer com outra professora as casas mais distantes, cadastrando crianças em idade escolar. Então perguntava: -- “Qual o ofício do seu pai?” -- “Artista” Ela logo aprendeu que o artista dominava alguma arte e a tinha como ofício. Podia ser oleiro - a cerâmica do Jequitinhonha é famosa e já era praticada pelos indígenas - fazedor de cangalhas, tecedor de couro para chicotes, tacas, laços de gado e peadores, fabricante de selas e cabrestos, de rédeas de crina de cavalo, tecelões dos teares manuais, coletores e fiadores do algodão plantado nas roças. Também coletores de mel de jataí, de paina, de sucupira, montador de currais e cancelas, curtidores de couro de bois e carneiros, mestres de obra, pintores e fabricantes de móveis. Temos até hoje cadeiras de pau-ferro perfeitas, fabricadas em 1935 para o casamento dos meus pais. Salinas era uma colméia operosa em que o trabalho honrava, as pessoas se orgulhavam do seu ofício. Não havia padaria na cidade. Tia Tute e Vó Milota vendiam biscoitos de todos os tipos, bolos confeitados, Dona Viviu de Saint Clair vendia roscas, Siá Aninha Guedes os doces de frutas. Muitos fazendeiros traziam os requeijões até hoje famosos na região, queijos cozidos e marmelada embalada na palha de bananeira. Havia costureiras especializadas em lingeries, vestidos de anjo e em trajes de montaria. Dona Lica Cardoso Ladeia cosia a mão as mais lindas toucas de seda e renda para os nenéns recém nascidos, que não deviam ter expostos a moleira e os ouvidos. Minhas tias Zenólia, Dalva e Maria Ramos eram eméritas modistas. Faziam vestidos de noiva, outros de seda para o enxoval, além da lingerie que me encantava. Dona Nazinha Mendes fazia lindas flores de tecido, palmas para coroação de Nossa Senhora e grinaldas para as noivas. Nós meninas aprendíamos bem cedo a cozinhar, e também a montar a cavalo, a bordar com Dona Amorosa Bittencourt e Dona Olga Miranda nos ensinava a cantar. Ensaiamos com ela o Minueto e o apresentamos na festa organizada para receber Dom Antônio de Almeida Morais Júnior, Bispo recém nomeado para Diocese de Montes Claros. Os ensaios para o Reisado de Tia Angélica impediram a mim e a Lina de ir para a fazenda Indiana, o Tanque onde papai fazia questão de levar a família para as férias escolares. Ficamos então hospedadas na casa da tia Odília Cordeiro, filha do falecido Coronel Cordeiro. Irmã de Dona Quezinha e da falecida mãe do Tio Rodrigo – pai de Lina. Tia Odília, uma dama clarinha, miúda, mansa e encantadora morava na Rua da Baixinha. O terreno ao lado não tinha ainda construção e o fundo do quintal era a beira do rio. Havia um grande pé de frutas do Conde, colhidas “de vez” e guardadas na dispensa até madurar. Nesta despensa, bem escura e sem janelas, guardavam também doce de mamão ralado com casca, de bolinhas de queijo em calda, doce de leite, requeijões e tijolos. Uma noite fomos surpreendidas lá, Lina e eu, nos fartando com as sobremesas. Tia Odília apenas bateu as pálpebras de um jeito muito peculiar e nos aconselhou a lavar as mãos e voltar para a cama. Iara Tribuzzi Primavera de 2015 |
Por Iara Tribuzzi - 18/8/2015 10:18:08 |
Faleceu hoje em Belo Horizonte aos 87 anos. Dr. José Carlos Valle de lima. Jornalista , homem público e ruralista.(...) Paulo, Só agora vejo a sua mensagem.Desde o ultimo sábado não acessava o montesclaros.com e fiquei em falta com a sua família. A Virgínia me dava sempre notícias do Ze´Carlos -amigo querido e precioso - mas quando enviou pelo email a notícia do falecimento não consegui me informar sobre o local do velório. A todos vocês meu sentido abraço de pêsames.Convivo com seus pais desde 1959,tenho por eles muito afeto e carinho. Iara Tribuzi |
Por Iara Tribuzzi - 5/8/2015 09:25:04 |
Querido João Leopoldo, Os ventos frios deste agosto trouxeram a notícia de que se apagou para sempre a sua preciosa voz. Levei também um susto ao ler que já completara 80 anos. Você chegou a Salinas - 1948 - 1949? com a Mestra Dulce Sarmento, minha prima Silvia Veloso dos Anjos (Silvia de Tia Joaninha) e outros montesclarenses, que alegraram mamãe com sua visita. Alguns se hospedaram conosco e fiquei encantada ao ouvi-lo cantar. Era bem menina, hoje perguntei à minha minha prima Lina o que se comemorava na cidade. Seria a visita de Dom Antônio Almeida Morais Júnior, Bispo da Diocese? Ela também não sabe, lembra-se apenas da presença de vocês. Depois o vi apenas de longe, acompanhava suas notícias. Descanse em paz, que os anjos se alegrem com seu canto. Iara Tribuzzi |
Por Iara Tribuzzi - 22/7/2015 10:17:09 |
Uma cena urbana É março, em pleno verão, ao meio dia . Os transeuntes vagam à procura das balaustradas das casas e dos toldos das lojas , ou qualquer sombra que arrefeça, mesmo que por instantes, o furor canicular. Vejo sair, das dependências da Santa Casa, uma mulher com o filho nos braços.(...) Sr. Isaías, passo sempre em frente a Associação Mineira de Reabilitação no bairro Mangabeiras e vejo mães - jovens e mais velhas levando ao colo crianças deficientes, às vezes bem grandinhas. É comovente o sacrifício delas e me incomoda o fato de não terem nenhuma ajuda para condução. Parabéns pelo o seu artigo. Iara Tribuzzi |
Por Iara Tribuzzi - 1/7/2015 10:17:29 |
Antigas recitações Nunca frequentamos a "Escola Maternal", que chegou a Salinas com o Instituto Nossa Senhora Aparecida - o colégio das irmãs - em 1951. Ao completar sete anos íamos diretamente para as salas de aula do Grupo Escolar Dr. João Porfírio. Quase sempre para a turma da Dona Aracy Borges - uma alfabetizadora genial, que nos deixava encantadas com os livros da Biblioteca, com poesias e cantigas, além da mágica conquista da leitura. Recitar era uma brincadeira divertida e prazerosa porque havia também uma programação do clube ASA, nas manhãs de domingo. Era organizada pelo João Costa, para estimular as recitações e cantigas, e um potente alto falante - colocado no Mercado Municipal - a propagava para a Praça e seus arredores. Mamãe era cuidadosa na escolha do repertório, e assim nunca me ensinou "O beijo do Papai” e ensinava "A flor do Maracujá" / Catulo da Paixão Cearense: “... A pois então eu lhes conto / a história que vim contar/ Por que razão nasce roxa/ a flor do maracujá ...” Sempre imaginei que desse preferência a autores mais clássicos, e quem a recitava, com muita expressividade era o Urlene Noronha, filho do Seu Zeca e Dona Czarina, nosso colega de turma. Eu ficava contrariada, nunca ganhei prêmio algum. Quando ele não era premiado, ganhava o Zé de Recenvindo, também da nossa turma, recitando: “... Catapora deu na nega / Sarampo deu na neguinha / Cascavel matou a vaca / Carrapato a bezerrinha...” Ou Elenice Ferraz, cantando, afinada: “...Venho de terras distantes Trago canções soluçantes Se quem ama me ouvir, há de chorar, em vez de rir...” Vera Versiani Martins, nossa prima, veio de Montes Claros para passar as férias em Salinas, e ganhou uma caixa de caramelos daqueles quadrados, maravilhosos, que vinham de Petrópolis, e os repartiu conosco, gentilmente. Ficávamos arrepiadas com as histórias da Segunda Guerra que nos chegavam pelo rádio, ligado apenas na Hora do Brasil, e nos impressionavam. Guerra era um assunto constante. Lá em casa fazíamos silêncio absoluto, porque um irmão da Mamãe – Caio Versiani dos Anjos servia na Marinha do Brasil, e um dos nossos navios já tinha sido afundado pelos alemães. Nunca imaginamos que a guerra a que se referia o "Beijo do Papai” fosse mais antiga, travada em 1903/1904 entre a Rússia e o Japão. Porto Arthur ficava do outro lado do mundo, à leste da Ásia e China, no Mar Amarelo, muito mais distante que a Europa. “...Foi no tempo da guerra entre a Rússia potente e os heróicos nipões, calmos filhos do oriente. Em torno a Porto Arthur o cerco se apertava como um cinto de ferro e fogo...” Também naquele tempo os pais eram distantes, cerimoniosos, nenhuma de nós se atreveria a beijá-los... Tive enorme vontade de aprendê -la, só sabia a primeira estrofe, mas quando encontrei o Urlene,cinquenta anos depois, ele não se lembrava mais. Há pouco tempo, almoçando em casa da Emília Almeida, amiga e salinense, falávamos sobre nossas mães e outra amiga disse que a mãe recitara "O beijo do Papai" até o final da vida, bem fraquinha. Pedi uma cópia e ela me enviou. Escrita a mão, preciosa. Fiz uma dobra no tempo e voltei ao Grupo Escolar, ao clube ASA, àquela Salinas guardada no coração e na memória. E ao Zé de Recenvindo e seu pai, recentemente falecidos em Montes Claros. Agora fico a imaginar que talvez a minha mãe ficasse também tocada, porque perdera o pai quando menina. Nunca saberei... Iara Tribuzzi, inverno de 2015 O beijo do papai Foi no tempo da guerra entre a Rússia potente e os heróicos nipões, calmos filhos do oriente. Em torno a Porto Arthur o cerco se apertava como um cinto de ferro e fogo, que fechava as portas da cidade a quem, valente, ousasse por ali penetrar, ou por ali passasse. Da boca dos canhões a morte, a rir traiçoeira, partia a cada instante, e na veloz carreira a vida ia ceifando aos míseros soldados tão desumanamente assim sacrificados. Quando, uma tarde, em que cessara num momento o canhoneio, como a cobrar novo alento, junto à linha de fogo uma adorável criança, sem mostras de temor e cheia de confiança apareceu correndo. O olhar de quem procura, ansiosa, descobrir naquela massa escura de uniformes e fumo um rosto conhecido; o risonho perfil de um semblante querido. Ao ver a pequenita um japonês, um bravo, que, como a língua pátria, entendia a do eslavo, pergunta-lhe, tomando em suas mãos calosas as mãozinhas da criança, alvas e cetinosas: – "Que desejas, pequena? Que procuras em meio da tropa, que aqui vês exposta ao bombardeio?" Quem és tu, de onde vens, que nome tens, menina?” – "Meu nome" – ela responde – "eu lhe direi, é Lina. Procuro o meu papai que há muito foi embora. Há muito que o não vejo e desejava agora vê-lo outra vez!" – "P’ra que?" – pergunta novamente o filho do Japão, dizendo incontinenti: – "Ele aqui já não está; seguiu mais para diante. Porém, se algum recado ou coisa semelhante quiseres que eu lhe dê, breve irei encontrá-lo. Descreve-me os sinais daquele de quem falo e eu prometo cumprir teu desejo inocente." - “É fácil conhece-lo” – informa ela contente – "É alto o meu papai, é forte e musculoso. Tem, como eu tenho, os olhos azuis e é formoso o seu rosto barbado. É claro o seu cabelo, também da cor do meu como bem pode vê-lo." E do seio tirando um pequeno retrato acrescenta a sorrir: – "Façamos um contrato: eu dou-lhe este papai para que não se esqueça e, vendo o verdadeiro, em breve o reconheça. Chama-se Ivan." – "Pois bem," – disse o nobre soldado que o retrato guardou. "Dá-me agora o recado que hei de procurar o teu papai... e em breve..." – "Mas não é um recado que eu peço que lhe leve" (replica-lhe a pequena) – "Diz-me então o que queres e eu prometo cumprir o que tu me disseres." – "Pois bem" – Lina responde – "É este o meu desejo: chegue junto ao papai e entregue-lhe este beijo..." E assim dizendo, salta ao colo do soldado e beija-lhe o semblante em lágrimas banhado. E um bravo que não chora, ante a horrível matança chorou ao receber um beijo da criança... Mas como dos canhões ouvisse a voz bramindo, Lina foi-se acorrer por onde tinha vindo! Durante a noite inteira o fogo não cessara e as tropas do Mikado aos poucos avançara num assalto feroz contra o inimigo em frente; cada qual mais revel, cada qual mais valente! Quando enfim à vitória as trombetas ecoaram e as bandeiras do sol vermelho tremularam sobre a trincheira russa à força conquistada, todo o céu se aclarava à rósea madrugada e pelo campo afora os mortos e os feridos eram, sem distinção, por todos recolhidos. Quando ao ver de um soldado a fronte descorada, pendida sobre o peito, a blusa ensangüentada, lembrou-se o japonês das feições da criança. Olha o retrato e vê a perfeita semelhança. Era um russo, o ferido, e o japonês o chama: – "Ivan!" – "Que me quereis?" O moribundo exclama, surpreso por ver o seu nome proferido por lábios do inimigo. – "Eu te trago escondido" – o bravo continua – "um beijo que te envia tua filhinha Lina... Ela mesma o daria se pudesse vir cá. Não podendo, guardei-o para agora o depor de tua fronte em meio. E ao dizer isso, calmo, o filho do oriente beijou a fronte do russo e o abraçou ternamente. |
Por Iara Tribuzzi - 24/6/2015 09:24:34 |
Tempo de infância "Francesco Magni, nascido na Itália antes do início da Segunda Guerra, me envia sempre suas histórias,e as remeto a vocês, com sua devida licença." Vovó gente miúda, mãe de meu pai e mais quatro filhos:três homens e uma mulher. Viúva,o marido havia morrido pelo tétano, doença infecciosa. Morava em zona rural uma vila de nome Bulciago Papai saiu de lá quando eu ainda era bebê,morávamos em Olate bairro do entorno de Lecco, cidade com indústrias de miudezas várias, derivados de arame e chapas. Isso por volta de mil e novecentos e trinta e quatro. Tudo bem. Agora, vocês sabem mais ou menos. Façam a imaginação trabalhar. Uma vida pobre, simples, mas eu diria feliz. No entorno havia um pouco de tudo nas hortas e nos campos. Apanhava das hortas dos vizinhos, cenouras, colhia das parreiras uvas, tomates,cerejas, peras,o que dava na época, não furtava, me apropriava. Quando nada havia nos campos,um capim de nome "erva cuca" que eu mastigava e sugava o caldo ácido. Era um pouco eremita,afastado,não tinha muitos amigos era autodidata nas besteiras que dizia e fazia. Conto agora uma experiência mal sucedida. Período das férias,meninada solta,mamãe havia concordado com o convívio de Benito,cachorro de estimação, estima não tinha muita, mas cúmplice de mais, Benito era inseparável seguidor e colaborador dos meus feitos, herdeiro do nome do não ilustre(porque de tal não tinha nada)mas conhecido Benito Mussolini. Mamãe, acredito eu que mais para seu sossego que naquele período passava por transtornos físicos, me levou para a casa da vovó Enrichetta com o legado explícito de bom comportamento, que não tolhia a total liberdade do estudo dos animais e vegetais das redondezas. Nesta área eu era aplicada autoridade, fazia tudo sem saber nada. Resolvi então que Benito deveria procriar..... mas como?Onde? Casa grande, paredes grossas, muitos quartos, deveria ter um lugar que servisse como"cachorridade" (maternidade para cachorro) Vovó criava galinhas, havia pintos soltos no quintal, deveria ter lugar para nascerem. Uma tarde,ouvi uma galinha cacarejar em um quarto do andar térreo,quarto de depósitos sempre fechado. Como uma galinha estava lá ? Verifiquei. Ela estava em uma cesta abaixo do parapeito da janela, agachada sobre uma duzia de ovos Não tive dúvidas:amarrei as patas de Benito e fiz a troca,coloquei a galinha na cesta de roupa suja e me afastei pra dar tempo que o alegre evento se consumasse. Quando vovó Enrichetta se deu conta da coisa,a coisa era horrorosa. Benito de patas amarelas sacudia o emplasto e a galinha espantada pulava desesperada. Imagine a situação. Tive que admitir que não seria por aí que aconteceria o nascimento dos filhotes de Benito. fran. |
Por Iara Tribuzzi - 20/5/2015 10:28:18 |
Casas Amáveis Nossa antiga casa da Avenida Francisco Sá é agora fogo morto, e a grande touceira das damas da noite do jardim parece entristecida. Suas paredes jazem quietas, impregnadas dos comandos do meu pai, das cantigas da minha mãe, das cadências rezadas pelas tias Silvinha e Tereza, da eloqüência da Tia Heloisa. Temerosa, não ouso entrar. Há laços de amizade que nunca se enfraquecem, apesar do tempo e da distância. Somos amigos do casal Fábio e Madeleine Rebello há mais de 55 anos, quando éramos todos solteiros. Nossas histórias fluem paralelas, sempre nos visitamos, cúmplices nas alegrias e perdas. Junto deles passamos a mais alegre e proveitosa das tardes, trocando livros e ideias. Júnia, a filha mais velha, ficou um pouco espantada ao encontrar sua mãe e eu recitando juntas a primeira estrofe de um antigo poema: “Quando nasceu a menina seu deus pai dono do mundo e sua mãe de espinha curva decretaram seu destino Serás flor amordaçada cama e mesa de marido terra de frutos futuros e depois canteiro murcho” Explicamos que a velhice nos deixa impressos desencantos e desencontros, dores nem sempre esmaecidas. Assim, gostamos de enfatizar nossos clamores registrados no livro Mulher pela autora mineira Yone Gianetti Fonseca, antiga aluna de Tio Cyro dos Anjos. Não conseguimos convencê-la, e ela nos convocou para fotos que serão agregadas aos registros já colecionados para comemoração dos 90 anos de Hernani Tribuzi. Iara Tribuzzi Outono de 2015 *Yone Gianetti Fonseca reside em São Paulo, é mãe do Filósofo e Economista Eduardo Gianetti Fonseca, autor de livros. |
Por Iara Tribuzzi - 13/5/2015 09:34:35 |
Minhas raízes montesclarenses afloram fortes, quando chego ao aeroporto da cidade. Meu coração bate descompassado, faz dobras no tempo. Vislumbra familiares, festas, amores, juventude, cantigas e sons dos long-plays de 78 rotações. O descompasso fica mais forte com as imagens de julho de 1957 – "Montes Claros vovó centenária", tão bonita de vestido novo. O encontro com Hernani Tribuzi, amigo até hoje presente, nosso casamento na Igreja Matriz de Nossa Senhora e São José, e a casa da Travessa Padre Marcos. A experiência maior da maternidade, assistida pelo Dr. Haroldo Tourinho e Dr. Konstantin Kristoff, mais tarde incentivador do meu envolvimento com as artes plásticas. E doador do meu pé de abricó-de-macaco que enfeita os dias da Fazenda Alvorada com grandes flores de perfume delicado e seu porte majestoso. Na década de oitenta o prefeito Toninho Rebelo, fidalgo e bem posto, encantando as sócias das Amigas da Cultura de Belo Horizonte, ajudando a cada uma entrar no ônibus que nos levaria às Quebradas. Caia uma neblina fininha, magicamente, mas se transformou depois em chuva torrencial e tivemos de prosseguir a pé na estrada de terra, onde ônibus atolou. Como meninas travessas, chegamos à casa de Arinha e Pedro Veloso com os pés encharcados. Pedro, anfitrião delicado, nos trouxe uma gaveta com suas meias, algumas bem esburacadas, mas as calçamos com gosto. O almoço de Arinha ficou na memória até hoje e ela nos forneceu as receitas. Quem faria igual? Ah! Montes Claros! Reúno minhas antecipadas saudades na voz do seu poeta maior. Oh bardo que cantavas docemente Nas noites de tristeza e de luar Oh bardo que cantavas para as estrelas Oh bardo não te ouço mais cantar... Iara Tribuzzi Outono de 2015 |
Por Iara Tribuzzi - 7/10/2014 10:54:30 |
Oi, Wanderlino Gostei muito da história do Bodão, tivemos uma parecida na Fazenda Alvorada, em Capitão Eneas . Em 1980 a compramos do Sebastião Mateus,e fiquei muito alegre porque era próxima do "Canadá" do meu pai Lúcio Ramos, na outra margem do Rio Verde. Hernani tinha se aposentado e foi convidado para o BNCC de Brasília. Então me dispus a organizar a chácara e reformar a pequena séde, ajudada por Papai. O encarregado era o compadre Jacinto,que também delegou suas tarefas à comadre Terezinha,porque apreciava uns goles que lhe tiravam a disposição. Ela tirava leite,tangia e verificava o gado. Era excelente cavaleira, usava um chapeu igual ao do Lampião. Mas quem me trazia as novidades era o Jacinto,às vezes com grandes "arrodeios". Um dia anunciou que deveríamos devolver o cavalo inteiro que tinha vindo de Salinas. -Jacinto, seria uma desfeita. O compare de lá ia por reparo. -Mas nós num vai ter outro jeito, não senhora. -Porque ? -Porque ele está com as égua já tem quase um mês, e não mostrou uma gota de entusiasmo com elas... No fundo da chácara tinha um tamarindeiro imenso,e certa manhã acordei com um escândalo horroroso. A mula Catita, que puxava o carroção, estava deitada de costas,no pó, sacudindo as pernas, zurrando e relinchando sem parar. -Mas o que é isso, Jacinto ? Ah, dona Iara, nós esqueceu ela no pasto com o cavalo inteiro, e agora ela VICIOU.. Papai mandou tirar sementes de laranja lima, socar no pilão e dar à mulinha. Só assim ela se acalmou... |
Por Iara Tribuzzi - 12/5/2014 14:41:17 |
Virgílio Preto Ontem almocei com amigos montesclarenses. Amigos desde o ano de 1959, dos meus tempos de solteira, quando toda a nossa família se mudou de Salinas para Montes Claros. Sou encantada com almoços familiares, prefiro-os a qualquer festa pomposa. Também os prefiro em casa, no aconchego das salas, servido pelos empregados antigos - não estranhos, contratadas apenas para o evento. Haverá algo mais saboroso que rosbife com cogumelos, batatas ao forno em finíssimas rodelas, salada variada e arroz, branquinho e solto,acabados de sair da cozinha ? E a sobremesa ? Doce de mamão ralado com a casca, compota de goiabas vermelhas e fatias de queijo de Minas, curado. Ô delícia !!! Música é a algaravia dos primos mais moços que se reencontram, dos irmãos que também são compadres, notícias dos que estão no exterior, risos e histórias antigas dos mais velhos... Como também gosto das genealogias, e os Versiani dos Anjos são numerosos e muito entrelaçados com os Veloso,me pediram informações sobre o Vovô Antoninho - o Coronel Antônio dos Anjos. Mamãe – Wanda Veloso dos Anjos Ramos - foi morar com ele aos dez anos, depois da morte súbita do meu avô José Versiani dos Anjos.E me contava suas histórias. Na verdade ele deveria se chamar Antônio Rodrigues Froes, mas sua mãe pediu ao marido que o registrasse Antônio dos Anjos,para que o sobrenome dela não se extinguisse. As pessoas estranham que ele seja irmão do tio Juca Froes. Os irmãos do Vovô, além do Juca Froes (José Rodrigues Froes), eram Tia Júlia, Francisco Minervino (avô do Darcy Bessone) e João (avô do Múcio Ataíde). Prometi conseguir uma foto de 1928, do maquinário importado da Alemanha para a sua famosa fábrica de botões, que o fez perder todos os bens, mais tarde. Intriga-me como chegaram até Montes Claros aquelas máquinas gigantescas, quando os trilhos da via férrea ainda estavam distantes. A conversa amena prosseguia, até nos lembrarmos do Virgílio Preto, comprador de gado para “Seu Benjamim da Anglo”, creio eu. O nome dele era Benjamim Pinto Veiga Soares, e morava na Avenida Francisco Sá, mas todos o chamavam Seu Benjamim da Anglo. Assim como chamávamos Virgílio de Virgílio Preto. Ele costumava ir à nossa fazenda Canadá - do meu pai Lúcio Ramos- e não se demorava depois de "apartar" os bois. Aceitava apenas um café com requeijão de Salinas, ou alguma fruta da chácara, mas uma noite as chuvas o prenderam, teve de pernoitar. Era garboso, empertigado, muito seguro de si, e o rodeávamos, porque tinha boas histórias. Chegava num cavalo alto, bem arreado, e falava bem, o que me encantava. Um dia se esqueceu de tirar as esporas e deixou marcas na sala de Mamãe. Dona Wanda sempre foi muito cuidadosa com horários das refeições, jantávamos bem cedo. Virgílio se levantou no meio da noite, foi à cozinha, abriu a geladeira e encontrou sobras de uma feijoada servida no almoço. Não teve dúvidas. Esquentou-a no fogão a gás, procurou farinha de mandioca, que nunca nos faltava, e pimenta malagueta. Fez um bom prato, saboreou calmamente, deixou tudo em ordem e foi dormir outra vez, satisfeito e sossegado. Na manhã seguinte Mamãe ficou horrorizada, para ela era inaceitável uma refeição pesada, de madrugada.Falou com Virgílio que ele se cuidasse, que só devia comer feijoada no almoço. Porque não tomara um copo de leite morno ? Ou um chá de folhas de laranja? Nunca me esquecerei da expressão dele, mais perplexo que ela. -Ô, Wanda, mas você é besta ! Lá dentro da gente é escuro, e dentro de mim é mais escuro ainda, porque eu sou preto. Como é que meu estômago vai saber se é dia ou noite? Iara Tribuzzi, noite de maio de 2014 Esta crônica é dedicada à família do Cida Athayde Lima e José Carlos de Lima.Augusta Versiani Fernandes, neta da dona Mariana (irmã do Dr. Carlos Versiani), casou-se com um Ataíde de Coração de Jesus - Francisco de Sousa Ataíde. Isso está na História da Família Versiani. E uma filha deles, Maria Augusta Versiani Ataide (D. Cota), casou com Hermes Froes, sobrinho do Vovô Antônio dos Anjos. Outro encontro das duas famílias. |
Por Iara Tribuzzi - 3/4/2014 19:23:07 |
Sr. José Ponciano, Agradeço-lhe pelo seu comentário, sou mesmo muito ligada a Montes Claros. Aprendi a ama-la antes mesmo de conhece-la. Mamãe falava muito da cidade e da família que deixara lá. Três dos meus quatro filhos são montesclarenses. É gratificante saber que nossa crônica tenha agradado a alguem, ou o tenha feito ressucitar lembranças. |
Por Iara Tribuzzi - 2/4/2014 10:09:13 |
WANDA VELOSO DOS ANJOS RAMOS * 1917 + 2014 Hoje é dia do meu aniversário e o melhor dos meus presentes seria ouvir a voz bonita da minha mãe... Uma das suas cantigas - alegre ou triste, que acalentasse o meu coração e aliviasse o meu estranhamento pela sua ausência. Ouvia desde sempre, porque ela gostava de cantar, e eu amava ouvi-la. Até hoje sei de cor as cantigas - A Marselhesa, a Giovinezza, o hino à América, à Escola, à Montes Claros, à Primavera... "A Primavera é uma estação florida Cheia de flores e real fulgor De flores enche o coração da vida De vida enche o coração da flor..." ********** "...Papai do céu, por favor Deixe voltar a maninha Pobre dela, coitadinha Ela nunca mais brincou A Mamãe vive a chorar E lá em casa tudo chora A vovó só conta histórias Quando a maninha voltar... Deus escuta meu pedido Ela não suja o vestido Eu vou segurando o véu E quando a noite chegar Maninha torna voltar Pra dormir aí no céu..." Intrigava-me quem seria esta maninha, ela não perdera ainda nenhum dos seus oito irmãos e seis meio irmãos. Depois me lembrei: Mamãe contava, repetidas vezes, que brincava, numa tarde, de zangue zalangue* com Clélia, sua prima em primeiro grau, filha dos tios Carlito Versiani dos Anjos e Joaninha Versiani Velloso. Discutiram pelo direito de se balançar, o balanço estava armado numa árvore gigantesca, no quintal. Clélia ganhou no par ou ímpar, sentou-se, e, ao firmar o pé no chão, deu um grito. Sentira uma ferroada forte. Os adultos vieram, mandaram chamar tio Mário, farmacêutico e irmão de tia Joaninha, mas não houve jeito. Um escorpião se disfarçara entre as folhas secas e horas depois a Clélia morria. Naqueles idos de 1923 não se usava levar crianças à psicóloga, e Mamãe se emocionava sempre ao se lembrar da prima e amiga. Mas não chorava, e aprendi com ela a segurar o choro. Em 1927 perdeu subitamente o pai e tal perda a marcou profundamente. Em 1930, Mamãe estava no cortejo do vice-presidente Mello Viana**, levando pela mão seu irmão Ruy, que tinha as pernas fracas, recém saído de uma doença prolongada. Quando passavam pela Praça Dr. João Alves, em frente à casa da famosa dona Tiburtina, casada com o médico doutor João Alves, onde está hoje o Automóvel Clube de Montes Claros, escutaram um intenso tiroteio, e ninguém sabia de onde vinham os tiros. A multidão se apavorou, e dizem que um veterano da Guerra do Paraguai gritou: - Deita, minha gente! Ambos se desgarraram da mãe, Vovó Antônia Veloso, que estava junto, e correram com o povo até o antigo Cemitério, no terreno da Catedral, que ainda não fora construída. Todos estavam assustadíssimos, os boatos eram muitos, diziam que havia mortos e feridos. Não havia luz no cemitério, e a escuridão aumentava o medo, os adultos estavam mais amedrontados que as crianças. Muito tempo depois alguém os reconheceu e levou-os para a casa de Vovô Antonio dos Anjos. Sua filha Alice Versiani dos Anjos já se sentia mal, não sabia o que lhes teria acontecido. Disseram à boca miúda que a ordem de atirar teria sido dada pela dona Tiburtina, registrada na história como mulher destemida e ousada. Dona Wanda estudou algum tempo em Pitangui, na casa dos tios Tonico Versiani dos Anjos e Sophia Ferranti, que eram muito sociáveis e promoviam bailes adorados por Mamãe. Daquela cidade trouxe uma canção lindíssima, contando a história da moça assassinada pelo pai, em Ouro Preto: “Dizem velhos moradores ainda transidos de horror que em tempos já distantes fora ali assassinado por um pai desnaturado um jovem casal de amantes...” *** Mamãe veio para Belo Horizonte, acompanhando o avô Antonio dos Anjos, os tios Cyro e Waldemar e as tias Alice, Biela e Carlotinha. Vovó Carlota Versiani dos Anjos já era falecida. Passou a frequentar a Escola Normal Modelo - hoje Instituto de Educação. Contava que todos se apavoraram com os tiros disparados durante a Revolução de 30, que atingiram várias galinhas do quintal, na rua Tomé de Souza, no bairro Funcionários. A família regressou a Montes Claros e ela se matriculou na antiga Escola Normal. Suas colegas eram Ruth Tupinambá Graça, dona Dezuita e Maria Aparecida Dias Netto, entre outras. Depois de formada, em 1933, deu aulas no Grupo Escolar Gonçalves Chaves, na Praça Dr. João Alves. Foi nomeada para o Grupo Escolar Dr. João Porfírio, em Salinas, junto com Heloisa Veloso Sarmento, sua irmã e amiga mais querida. Mudaram-se para lá, em 1934. Casou-se em 1935 com o salinense Lúcio Ramos, e éramos cinco irmãos. O mais velho - Wilson José Ramos, faleceu aos 46 anos. Em 1959 toda a família se mudou para Montes Claros e dona Wanda ainda trabalhou no Grupo Escolar Dr. Carlos Versiani - nome do seu bisavô - até se aposentar. Lá, moramos na Avenida Afonso Pena e depois na Avenida Francisco Sá. Quando Papai faleceu, em 2002, Mamãe quis permanecer na mesma casa, onde residia há mais de 30 anos. Sua saúde foi se debilitando, nos últimos anos estava na cadeira de rodas. Tinha muito medo do CTI, pedia que não a deixássemos ser levada para lá. Sua estrutura óssea definhou, ficou uma mulher miudinha, que ainda adorava os jornais. Já não lia mais os amados livros, só reconhecia as pessoas muito próximas. Até se esqueceu de rezar o terço, de que tanto gostava. Via TV, mas nada guardava. Nunca maltratou as acompanhantes, não ficou agressiva. Era sempre muito bem educada, agradecia a cada vez que lhe serviam alguma coisa. Gostava de recitar comigo as antigas poesias - Vozes d`África, A cruz da estrada... Ainda há pouco tempo cantávamos juntas e ela se lembrava das cantigas - perfeitamente. Às vezes me corrigia - está desentoando! ...Hoje é dia do meu aniversário e o melhor dos meus presentes seria ouvir a voz da minha Mãe. Uma cantiga alegre ou triste, que acalentasse o meu coração e aliviasse o estranhamento pela sua ausência... Iara Tribuzzi, outono de 2014 * Zangue zalangue: era como se denominavam os balanços rústicos ou caseiros, confeccionados com cordas e tábua. ** Tiburtina: Em 6 de fevereiro de 1930, registrou-se trágico incidente em Montes Claros, que Assis Chateaubriand batizou de “emboscada de bugres”, de que se aproveitou largamente a imprensa nacional. Um tiroteio vespertino na maior cidade norte-mineira, após ali desembarcar o vice-presidente da República, Mello Viana, acompanhado de ilustre comitiva, contribuiu para precipitar o processo de ebulição política e a eclosão da revolução, que se confiava, seria mais que substituição de um presidente. SANTOS, Manoel Hygino dos Vargas - de São Borja a São Borja – Belo Horizonte, 2009 *** “Ai, minas de Vila Rica Santa Virgem do Pilar! Dizem que eram minas de ouro... - para mim, de rosalgar, para mim donzela morta pelo orgulho de meu pai. (Ai, pobre mão de loucura, que mataste por amar!) Reparai nesta ferida que me fez o seu punhal: gume de ouro, punho de ouro, ninguém o pode arrancar! Há tanto tempo estou morta! E continuo a penar.” MEIRELLES, Cecília, 1901-1964 Romanceiro da Inconfidência, São Paulo, Editora da USP; Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2004 Belo Horizonte, outono de 2014 |
Por Iara Tribuzzi - 4/12/2013 17:13:57 |
"Corria o ano de 1958. Em outubro de 1957 os russos haviam lançado o primeiro satélite, o Sputnik, tema predileto, por muito tempo, das conversas montesclarinas" Oi, Augusto Sempre o leio com muito gosto, e de vez em quando encontro palavras e expressões que fazem uma dobra no tempo. Balas dum dum me encantam, desde menina. Eram mencionadas com o maior respeito,embora até hoje não saiba bem como são. Eram importantíssimas, inspiravam temor, enfatizavam crimes e tocaias Esperava vê-lo no lançamento do livro da Carmen Netto. Um abraço, Iara |
Por Iara Tribuzzi - 19/10/2013 12:41:59 |
"O mês de outubro está em curso e nos faz lembrar nosso tempo de criança em Jacarací, nossa terrinha, sertão baiano de sol gostoso e pouca chuva. Mês de outubro, tempo de pequi. (...)" Oi,Sr. José Prates, Sempre leio as suas crônicas, hoje tenho duas dúvidas. Como é o mandapuçá ? Fiquei também intrigada como o gado comeria os pequis, tão cheios de espinhos. Criada em Salinas, na fazenda,não conheci de perto os pequizeiros, só via os frutos à venda, no mercado. |
Por Iara Tribuzzi - 9/10/2013 08:09:35 |
"Para coroar de êxito maior o uso do palavrão já existe - não sei se já publicado - um dicionário todinho dedicado ao assunto, com toda a maestria do etnógrafo Mário Souto Maior, do Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais." Oi, Wanderlino Fui criada com rigor e estudei com freiras. Elas afirmavam que deveríamos ler livros "edificantes",e tentar apurar a linguagem. Embora tenha lido os tais livros proibidos - Josefina, A filha do diretor do circo e outros, os palavrões me incomodam até hoje,e talvez concorram para empobrecer o vocabulário. Mas estão aí, no dia a dia ... |
Por Iara Tribuzzi - 27/9/2013 10:59:00 |
"(...) estou (...) enviando foto das antigas que nilo me enviou. Para (...) acervo historico e para o Montesclaros.com." Oi, José Aluisio A moça que foi identificada como "Iara "não seria Marília Ferrante - agora Rabello ? Bem gostaria de ter participado deste grupo alegre,vou conferir com a Mary Pimenta. Perdi , quando vim do Rio para Bh, as fotos dos tempos de Montes Claros. Se alguem puder me enviar alguma,ficarei grata. |
Por Iara Tribuzzi - 24/9/2013 16:01:00 |
"Bar do Tamiro, do Altamiro. Eis aí um lugar antológico de Montes Claros, nos anos 50/60/70. Ficava na avenida Afonso Pena, esquina da travessa Padre Marcos, santo belga cuja vasta casa foi derrubada recentemente. Ao contrário, minúsculo, 3 metros por 3, se tanto, o Bar de Tamiro supria de pão, de pastéis, biscoitos, balas, pinga, vermutes, de um tudo enfim, a quem morava no centro de Montes Claros." Para Altamiro As lembranças do leitor Mariano levaram-me de volta aos anos sessenta, quando morava em Montes Claros. Tenho saudades do moço Altamiro _ claro , tranqüilo e reservadissimo, que mantinha sempre aberto seu bar na esquina da Av. Afonso Pena com a Travessa Padre Marcos. Talvez vendesse muitas doses de pinga e de conhaque, mas tinha estoque para as emergências das donas de casa. Vendia um excelente bolo de fubá em fatias, e doces tentadores: cocadas, pés de moleque e doces de leite. Por onde andarão Dona Neinha, aparentada do Padre Janjão, seu marido e os muitos filhos? Defronte a casa de meus pais na Avenida Afonso Pena moravam Neném Barbosa e Dona Geny , sua filha Luisinha se casara em mil novecentos e sessenta. A casa era nova, bonita, recém construída, e as empregadas uniformizadas. Seu Neném, muito amigo de meu pai, ia sempre à nossa casa, na Travessa Padre Marcos, antiga residência de Carmélia Barbosa , ver as crianças e tomar um café, bem ralinho, como gostava. Ricardo, aos três anos e muito falante, comentou: _ Não conheço outro neném velho, só esse. Doutor Mariani morava ao lado da casa de meus pais,na Avenida Afonso Pena, com Dona Lia e o filho José, e adorava conversar na porta da rua. Um pouco adiante moravam Vovó Antonia e o marido José Luiz, padrasto de Mamãe . Espirituoso e voraz leitor de romances.Os filhos Tereza, Maria Luiza, Coró e Chiquito moravam ainda com os pais. A primogênita Silvia já se casara e Zezito estudava medicina no Rio de Janeiro. Em frente a casa deles residia Dona Dezuita , em sua famosa Escola de datilografia, por onde passaram gerações de monteclarenses. A casa dos primos Nuno Lages Filho e Gisélia Henriques era bem próxima e mais adiante ficava a casa dos tios Lelé e José Henrique de Souza Seu Aristides Maia e Dona Naná residiam junto a casa de Doutor Mariani. Numa noite, em hora bem avançada, ela bateu nossa porta. Não havia Estação repetidora de televisão, todos se recolhiam cedo mas eu ficava até tarde corrigindo os exercícios dos alunos do Grupo Escolar. Pois dona Naná entrou dizendo: _ Vim conversar um pouco com você. Aristides chegou em casa às seis horas da tarde, vestiu o pijama e sentou-se na varanda. Tentei puxar assunto, várias vezes, ele sempre calado e as horas passando. Então lhe disse: _ Oh! Aristides, o assunto esta ótimo, a prosa muito boa mas eu vou ali conversar um pouco com Iara. Seu Aristides, sempre tranqüilo, não ficou agravado e a filha Cida e eu achamos muita graça da estória. Outra noite, também em hora tardia, Márcia Graça Andrade, filha de Dona Ruth e seu Armênio me chamou, aflita: _ A casa de Vovó Dona esta pegando fogo. O incêndio consumiu quase tudo, embora as pessoas tentassem ajudar. Não havia Corpo de Bombeiros. Não pude sair de casa,deixando as crianças, nem sei como o fogo começou. Lamentei que se perdessem tantos objetos bonitos de Dona Maria , Feli e Carmem Lúcia, que permaneciam calmas, apesar das perdas. Num fim de tarde de fevereiro de mil novecentos e sessenta e cinco embarcamos numa cabine dupla do trem de luxo da Estrada de Ferro Central do Brasil. Meus filhos, Ricardo, de três anos, Flávio, de dois e Lúcia Maria ainda bebê de dois meses, além de duas ajudantes. Meus pais e irmãos tinham ido a um casamento em Taiobeiras, e Hernani já trabalhava no Rio de Janeiro. Estávamos de mudança. Então, seu Lindolpho Laugthon, um amigo precioso, encarregou o filho Ricardo de nos acompanhar até a Estação de Montes Claros e acomodar tal “troupe” com sua enorme bagagem. Não havia fraldas descartaveis, iorgute em copinhos e nem barrinhas de cereais. Levávamos grande matula e muitas mamadeiras, apesar do vagão restaurante oferecer um bom jantar, fresquinho, com um inesquecível ovo frito,que meus filhos chamavam de ovo deitado . Assim resgato minhas lembranças dos bons tempos montesclararenses e dos amigos cavalheiros – Altamiro - um lord inglês calmo e imperturbável – e do Seu Lindolpho Laugthon, atento às dificuldades de uma mãe com tres crianças pequeninas. Iara Tribuzzi Outono de 2010 |
Por iara tribuzzi - 24/9/2013 08:25:05 |
(...) Nos anos cinquenta, a gente mais bonita e mais falante da cidade eram os jovens do footing, Rua Quinze e Praça Doutor Carlos, trecho que ia do antigo Clube Montes Claros até a esquina da Rua Doutor Santos, bar de Manoel Cândido e Hotel São Luís, transformado em Caixa Econômica e, depois, em Copasa. (...) Bom dia, Wanderlino Sua crônica me levou à antiga Montes Claros,à Rua 15 que passei a frequentar em 59. Lá estava a Imperial - e só comprávamos lingerie com a Violeta! No quarteirão abaixo ficava a Casa Colombo,com seus tecidos tentadores e máquinas de costura... além do atendimento especial de Tatá e Jaiminho Rabello. Por favor me esclareça - a pensão da Dona Tonica ficava naquela casa onde se instalou o boteco do Altamiro ? E a biblioteca, onde estava ? Um abraço. Iara |
Por Iara Tribuzzi - 6/9/2013 09:41:43 |
NOTURNO NÚMERO DOIS* Iara Tribuzzi A única mulher de família que pôs os pés na Coréia, rua da zona boêmia de Salinas, e em plena madrugada, foi minha Vó Milota. Mesmo assim por engano e também porque não sabia dar corda no relógio de carrilhão do Vô Adelino. Ou talvez soubesse, mas era idosa para subir num banco e alcançar o tal relógio, lá no alto da parede da sala de visitas. Sua viuvez era recente, depois de sessenta anos casada com o homem mais cordato da cidade. Ao perder o companheiro, passou a ser tutelada pelo único filho homem, bem menos cordato que Vovô, mas atento ao dever de zelar pela mãe. Sua primeira providência foi mandar buscar uma das muitas afilhadas de Vovó, mocinha educada e gentil, para acompanhá-la. Do alto dos seus setenta e quatro anos, Vó Milota era vivaz e muito bem disposta. Vivia a fazer biscoitos e doces, costurava sempre, e recebia, aos sábados, suas comadres e compadres que vinham da roça. Servia-lhes uma merenda e lia para todos o que achava interessante no Almanaque do Santuário de Nossa Senhora Aparecida. Sempre me impressionou seu extremo cuidado com grávidas e parturientes. Apesar da rotina atribulada, tirava um dos dias da semana, com chuva ou sol causticante para subir ao Morro do Capim e ensinar os cuidados com o parto e com recém-nascidos. Recomendava, sobretudo, que no resguardo as parturientes fossem preservadas de sustos e de contrariedades, que lhes poderiam causar grande mal. Numa das muitas noites de insônia, madrugada escura como breu, aconteceu com Vovó o inusitado. Não havia réstia de luz e nenhum luar. Ela sacudiu a afilhada Venerita, que resmungou não ser a hora de acordarem, porque ainda estava morta de sono. Vó Milota retrucou: - Que nada! Os galos já amiudaram o canto, já amanhece! - Mas, madrinha, aparteou Venerita, está escuro demais. Não enxergo nadinha. - Pois vá buscar um lampião, acenda o fogo e passe um café. Estremunhada de sono, a pobre moça fez o que lhe pedira Vó Milota. Vestidas e arrumadas, saíram rua afora, rumo à capela do Colégio das irmãs, lá no alto, perto do Morro do Capim. Seguiram pela rua da Baixinha, subiram em direção à casa paroquial e alcançaram a rua do cinema. Venerita ponderava que estava tudo muito estranho. Não se via viv’alma. - Madrinha, Madrinha, esta hora pode estar errada. - Que nada, fique quieta. Estamos quase chegando. Em silêncio, na escuridão total, continuavam ladeira acima mesmo vislumbrando, ao longe, pálidas luzinhas móveis, de lanternas de mão. Venerita apavorou-se. Não seriam "visagens"? De braços dados, subiam a rua Padre Salustiano, e quando passavam entre o Cine Teatro Salinas e a Igreja Presbiteriana, aconteceu um despropósito. Totalmente imersas na escuridão, andando devagar, amedrontadas, atentas aos sons da noite, ouviram, de repente, um piado triste da corujinha caburé que morava na torre da Matriz. Ao longe, um sapo coaxou em resposta, uma gata vadia miou, descontrolada, enquanto um vira-latas bobo latia para o nada. Acima do Morro do Capim uma chuva de estrelas, como brasas cadentes, riscou o negrume da noite. - "Virge Nossa"! Que esparrame agourento, pensou Venerita, mais alarmada ainda. Preocupadas, nem perceberam que as luzinhas distantes se aproximavam, e alguém perguntou a Vovó: - Madrinha, que aconteceu? Aonde vai, a esta hora? - Vamos assistir à missa no colégio das irmãs. - Mas o colégio ficou para trás e aqui não é lugar para a Senhora. Estamos na "Coréia". O rapaz, seu sobrinho, ofereceu-lhe o braço, deram meia-volta, e marcharam ladeira abaixo, em silêncio; Vó Milota emburrada, o moço ressabiado pela flagrante esbórnia e Venerita muito transtornada. - E agora, madrinha? Se souberem que estive na "Coréia" nem casamento arranjo. - E alguém precisa saber? Só se você mesma contar. - Mas madrinha, falei com a senhora que aquele canto do galo era canto enganoso, não de dia amanhecendo. Diz o povo que galo quando canta fora de hora tem moça fugindo para casar. Vovó passou-lhe um olhar de reprovação, mas, no escuro, ela não viu. Sentiu apenas a dor do apertão no braço, e ficou quieta. Calados, todos voltaram para casa, o moço se despediu e Vó Milota, para disfarçar o engano, deitou-se novamente. Antes de pegar no sono disse pra si mesma: - Vai ver que esse galo velho endoidou de vez, melhor fazermos dele uma farofa. Belo Horizonte, sem data. |
Por Iara Tribuzzi - 3/6/2013 11:48:07 |
" Uma escola de violência -Manoel Hygino - Jornal "Hoje em Dia" Nesta época em que, mais uma vez, se aventa a hipótese de fim do mundo, em que a terra treme sucessivas vezes no Norte de Minas - sobretudo na gloriosa Montes Claros, em que meteoritos cruzam os céus, um dos quais deixou em torno de mil mortos em território russo, há muita probabilidade de que muito mais possa acontecer. Cumpre ampliar conhecimentos sobre a matéria para se saber o que o futuro nos reserva.(...)Ouvira dizer que um conterrâneo fora atropelado e morto quando descia da estação da Estrada de Ferro Central do Brasil, em Belo Horizonte, e tentava cruzar aquele importante logradouro público. A estação abriga hoje o Museu de Arte e Ofício.(...) Sou leitora assídua do montesclaros .com, li sua mensagem e pergunto : - Seria este Capitão João dos Anjos Frois irmão do Coronel Antônio dos Anjos ? Verifiquei no meu vade-mecum - Historia da família Versiani e quero crer que seja mesmo nosso tio bisavô, mas não sabia do atropelamento. Agradeço-lhe, gosto muito das histórias da família. Sabemos, pelas narrativas dos familiares, que o "Vovô Antoninho" assinava apenas dos Anjos a pedido da sua mãe,para que não se finasse o sobrenome. Em 1940 , o Coronel Antônio dos Anjos viera a Belo Horizonte visitar os filhos ,há uma ultima foto sua com o neto Flavio Rabelo Versiani , ainda bebê, no colo. Ao chegar em casa pediu à filha Alice que lhe preparasse um chá, sentia um enorme cansaço. Ela o encontrou desfalecido, e ele veio a falecer logo depois. Um abraço. Iara Tribuzzi |
Por Iara Tribuzzi - 25/5/2013 08:05:49 |
Rondó Ô avó triste e risonha, Vê se agora me respondes - Que profunda dor escondes Atrás do teu doce olhar? -Não sei, não sei ... Meu coração é transido De dor esmaecida Uma dor tão antiga Dela até já me esqueci Vive sempre escondida Mas às vezes se revela E inquieta, me sorri Ô avó triste e risonha Vê se agora me respondes Que sonhos tu me escondes Atrás do teu doce olhar? Nem sei, nem sei... Meu coração é aquecido Por um sonho tão antigo E agora esmaecido Dele até já me esqueci Vive bem escondido Mas às vezes se revela E assim me faz sorrir. |
Por Iara Tribuzzi - 24/5/2013 20:30:43 |
Classificados Vende-se uma fazenda às margens do rio Verde Grande, com tamarindeiros imensos, um pé de abricó de macacos doado pelo Konstantin Christoff em 1984, além de muitos ipês, oitizeiros e sibipirunas adultos, e um jatobazeiro jovem. Há alamandas antigas, na cerca do pátio interno, um arco de buganvílias explodindo em cores, uma cerca viva de folhagens trazidas da casa do Sion, em Belo Horizonte. Da janela da sala de jantar vê-se um grande pé de damas da noite ao lado de um manacá, este de menor porte. Há um gramado bem cuidado, e nele uma touceira de jasmins do Cabo, outra de murtas floridas. Adiante da sebe - um pé de sapucaia, um pau mulato, um jequitibá, três amendoeiras e dois flamboyants gigantescos, um deles com o tronco coberto de jibóias trepadeiras. Ao lado da garagem, misturados às flores de amor bem-casado, uns melões de São Caetano, que deixamos ficar, cobrem a cerca. Bem junto, bastões do Imperador, vermelhos, doados pela Cleonice Laugthon, e resedás branquinhos, que alguns chamam de escumilhas ou rosas Norma, fornecidos por Paulo Berutti, amigo agrônomo, um tapeceiro genial. No final das tardes chuvosas costumam passar, à leste desse Éden, bandos de garças brancas, voando na direção sul - norte. Deixaremos outro bando, de cocás ou galinhas d` Angola, que estão lá há tempos, nunca permitimos matá-las. Também deixaremos muitos sonhos bem enterrados, e estarão num bom lugar, porque a terra é boa, fértil, dadivosa e acolhedora. Sempre! Este anúncio é dedicado ao amigo Reivaldo Canela, autor de "Menino Pescador", apaixonado pelos pássaros, peixes, plantas e frutas, e pelos antigos quintais da sua amada Montes Claros. |
Por Iara Tribuzzi - 27/9/2012 18:34:03 |
Oi, João Carlos Foi duro nos despedirmos de você, entrarmos em sua casa enlutada, ver tanta tristeza no olhar de cada um dos seus meninos -Danilo, Dario,Daltron, Dirceu e João Carlos. Encontrar Zezé abatida, perdida em brumas . Voltamos a BH, e as lembranças tomam conta de mim. Lembra-se da comemoração dos vinte e cinco anos de formatura, sua e do Hernani? No ano de Deus de 1974? Viajamos para o km 47 - como chamavam a Universidade Rural - de carro, já atrasados. Ouvindo histórias, do tempo em que,"internos" alí, vocês e o Jorge Nova da Costa, que viera também de São Luis do Maranhão, participaram dos primeiros tempos da nova sede. Sentiam falta do Rio e da praia, no campo afastado. Mal terminara a segunda guerra, as novidades do governo eram muitas, as do Brasil também. Finda a cerimônia, os discursos e o almoço fomos para o Rio e, à noite, vimos "Brasileiro - profissão esperança" - no Canecão, com Paulo Gracindo e Clara Nunes. E mais saudades. Da antiga Montes Claros, que também a mim acolheu gentilmente, do Banzé, da juventude, das esperanças. Da sua mansuetude e gentileza,qualidades hoje raríssimas. Tantos sonhos ,agora preciosas lembranças. E saudades, sem esperanças. O melhor abraço da sua velha amiga, Iara |
Por Iara Tribuzzi - 4/3/2010 08:36:54 |
Para dona Ruth e Feli Iara Lúcia Ramos Tribuzzi Querida dona Ruth, Li, enternecida, sua crônica sobre Felicidade Tupinambá –nossa amada Feli. A inesquecível noite de seis de Janeiro de 1961- noite de Reis e véspera do meu casamento deixou-me a mais preciosa lembrança da sua generosidade. Morávamos então em Montes Claros, na Avenida Afonso Pena esquina da Travessa Padre Marcos e na outra esquina, em diagonal, num casarão antigo cujas janelas se debruçavam também na Rua Pedro II, moravam Dona Josefina com os filhos Feli, Cassemiro, Dona Maria e a neta Carmen Lúcia . Hernani Tribuzi e eu nos casaríamos na manhã seguinte, dia sete, às nove horas ,na igreja matriz de Nossa Senhora e São José, o Padre Quirino celebraria a cerimônia. Meus pais receberiam, depois, em casa, grande parte da nossa família salinense, e amigos.Haveria um almoço sob o comando de Olímpio de Abreu,casado com Sílvia Veloso Barbosa, irmã de Mamãe pelo lado materno. Lá pelas sete da noite chegaram inesperados hóspedes de Belo Horizonte, e lembro-me de ter mudado de lugar os presentes recebidos, para abrir espaço e acomodá-los. Feli veio ver se precisávamos de alguma coisa, e Mamãe lhe disse que a casa não fora ainda enfeitada, ela não sabia o que fazer, nem como, e estava meio aflita. Feli atravessou calmamente a rua e trouxe de casa grandes vasos com arranjos de flores secas que nos pareciam belíssimos, mas ela deu neles alguns retoques. Ajuntou verduras, legumes, folhagens e flores e buscou algumas rosas do jardim de Dona Naná Maia, grande amiga e vizinha. Começou a trabalhar, calada e quieta. Montou na mesa da sala de jantar um inacreditável arranjo, usando todos os chuchus, grandes e pequenos , tirados do chuchuzeiro do quintal. Continuou trabalhando noite adentro, tranquilamente, com empenho e perfeição.Suas mãos habilidosas fizeram maravilhas, produziram milagres, e à medida que a noite avançava eu me acalmava, só de estar perto dela, que me falava, no silêncio da noite, sobre o seu próprio noivado desfeito, um grande amor contrariado. A expectativa do casamento me assustava.Tinha apenas dezenove anos, poucas informações, e era pretensiosa, acreditando que o meu amor e o meu empenho fossem suficientes para uma vida feliz .Todas as pessoas da casa se recolheram, inclusive os hóspedes, ficamos as duas, dando os retoques finais. Ao terminar Feli olhou para mim e disse: - Você se esqueceu de pinçar as sobrancelhas, dê um jeito nelas quando acordar. Meu dia começaria de madrugada, assistindo a primeira missa da capela da Santa Casa para comungar. Não poderia ficar em jejum até as nove horas, como determinavam então as normas da Santa Igreja. Depois da missa e do desjejum a prima Gisélia Henrique Lage, também vizinha e madrugadeira, tiraria os “bobs” do meu cabelo, me pentearia com cuidado e ajudaria na maquillagem simples. Lamento não ter uma só foto da casa enfeitada, e não sei se disse a Feli como foi importante sua presença e inestimável ajuda. Faço hoje um agradecimento sensibilizado a ela, ao meu tio Olímpio de Abreu, pelo almoço fantástico, a Águeda Avelar pelas tortas maravilhosas, e a tantos outros montesclarenses generosos que organizaram nossa festa, naqueles bons tempos de simplicidade, quando não havia, ainda, os buffets. Iara Tribuzzi Verão de 2010 |