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montesclaros.com - Ano 25 - sexta-feira, 15 de novembro de 2024
 

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Mensagem: Em tempo de muriçoca Manoel Hygino Hoje em Dia Foi-se o tempo em que se tinha direito de ser criança. As condições de hoje impedem-no. Há dias, o advogado Ramiro Barreiros, diplomado pela Faculdade Milton Campos, relatava as saudades do tempo bom que ficou para trás e não recupera, nem se repete. Jogar pião, pular amarelinha ou maré, bolinhas de gude, pular corda, subir em árvores, descer morro sujo, andar a cavalo, brincar de pique, soltar papagaio. Onde ainda se praticam estes divertimentos puros, dos meninos e meninas de tempos idos e vividos? Em verdade, vos digo que o mundo mudou, nem sempre para melhor. Criança, mal saída das fraldas, já anda com um celular à mão (os portugueses o denominam com propriedade de telemóvel!) ou está batendo as teclas do computador... Melhor? Pior? Os infantes não saem à rua, porque os pais, com muita razão temem por sua segurança. Nas cidades grandes, os doces enlevos e alegrias de antigamente foram abolidos ou sequer são conhecidos. A isso se deve chamar “progresso”, o mesmo que devora velhas e vetustas construções erguidas pelos ancestrais. Havia um comportamento comum às cidades interioranas. Outro dia, li o que escreveu pessoa identificada apenas como Zilda. Ela lembra que, outrora, havia mais terrenos vazios e menos canais de televisão, mais cachorros vadios e menos carros na rua. Havia carroças na rua e carroceiros fazendo o pregão dos legumes, mascates batendo de porta em porta, mendigos pedindo pão velho. Por que os mendigos não pedem mais pão velho? Quando o erudito médico Hermes de Paula publicou uma alentada história de minha cidade e, por extensão, de todo o norte-mineiro, na parte de antologia, havia muriçoca e duas crônicas sobre mendigos. Uma delas, muito modesta, de adolescente sonhador, fora por mim escrita e foi incluída numa coletânea da Editora Globo, de Porto Alegre. Como conseguiriam? Por que a selecionaram? Sei que os mendigos não acabaram e a fome persiste, nas grandes e pequenas localidades. A estatística saiu, há poucos dias: Um bilhão de pessoas passa fome no planeta. Havia loucos (?) que perambulavam pelas ruas, assustando as crianças, que - apesar de tudo - costumavam não se assustar com eles. A Velha do Saco atemorizava meninos e meninas. Registre-se que o saco era de estopa. Depois inventaram o plástico, houve uma profunda transformação nos costumes. Antes, para se ir ao mercado levava-se cesta ou sacolas de palha, que voltavam à casa carregadas das mercadorias adquiridas. Zilda me lembra: a gente transportava cascos vazios para trocar por garrafas cheias. O consumismo muda tudo. Refrigerantes custavam caro, só eram comprados para consumo nos fins de semana. As latas de cerveja eram de lata mesmo, não de alumínio e leiteiro entregava o leite de casa em casa, em garrafas. Não se falava, de modo geral, em óleos vegetais. O hábito era a banha de porco, o toucinho, que muitos pronunciavam “toicinho”, com i. As donas-de-casa mantinham uma lata com a gordura debaixo da pia. Usavam-se as antigas latas que serviram outras destinações, ao chegar. Sobretudo nas regiões quentes, não podia faltar o que se chamava “cortinado”. Era um mosquiteiro, para evitar o incômodo dos pernilongos nas noites. Um bichinho barulhento que em minha região recebera a denominação. Não faltava espaço. As residências tinham quintais, a que não faltavam laranjeiras, pessegueiros, pinhas, extraídas nos pés e consumidas avidamente. Fogão a gás, nem sonhar. A lenha crepitava para feitura das refeições: almoço e jantar, café da manhã, café do meio-dia, oferecido às 2 da tarde, e o da noite, lá pelas oito, quando se ouvia “Voz do Brasil”, o programa oficial diário do Governo Getúlio Vargas. O rádio na sala dava as notícias, misturada a voz do “speaker” com ruído das descargas elétricas. Uma guerra. Quem chegava de viagem era recepcionado com compoteiras de doce, maneira de demonstrar carinho e amizade dos que tinham ficado. A metamorfose dos dias que se sucedem. O café passava pelo coador de pano, chaleiras apitavam, lojas de discos vendiam “long-plays” e fitas k7. Tudo supimpa, que hoje se substituiu pelo vocábulo bacana. Telefones tinham gancho, fio e o disco para se ligar para alguém. O que sobrou?

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